Unicamp atinge 50% de alunos oriundos de escola pública; debate racial permanece
- 08/04/2017 15h23
- São Paulo
Camila Maciel
– Repórter da Agência Brasil
Estudantes oriundos de escolas públicas
representam, pela primeira vez, metade dos matriculados na Universidade
Estadual de Campinas (Unicamp). No vestibular de 2017, o percentual chegou a
50,3% dos aprovados, de um total de 3.248 ingressantes. A instituição adota um
sistema de bonificação para alunos da rede pública por meio do Programa de Ação
Afirmativa para Inclusão Social (Paais). A reitoria comemora ter atingido a
meta de inclusão prevista para esse ano, mas grupos da universidade defensores
do sistema de cotas destacam que a medida ainda não é suficiente.
O coordenador-executivo da Comissão Permanente para
os Vestibulares (Comvest), Edmundo Capelas de Oliveira, aponta que a mudança no
Paais com a inclusão do bônus de pontuação desde a primeira fase (antes era
computado apenas na segunda) contribuiu para o resultado. “Uma das vantagens do
programa é que ele permite ajustes, sempre que necessário”, disse. Segundo o
coordenador, a comissão produz simulações e estudos para subsidiar as
discussões no Conselho Universitário, órgão máximo da Unicamp responsável por
definir as políticas de acesso.
Para o professor Mário Medeiros, do Departamento de
Sociologia, o resultado representa um avanço, pois cumpre um aspecto da função
social da universidade pública, “mas não contempla plenamente no que diz
respeito à entrada de estudantes pretos, pardos e indígenas”. Ele destaca ainda
que é preciso entender de quais escolas os alunos são oriundos. “Há uma crítica
ao processo do Paais de que ele atende um perfil específico de escolas públicas
[técnicas e militares], que são conhecidos como colégios de elite [entre os da
rede pública]”, avaliou o professor, que integra o grupo de trabalho sobre
cotas criado pela reitoria.
De acordo com Oliveira, o percentual de pretos,
pardos e indígenas está próximo da meta de 35% entre as vagas reservadas para
alunos de escolas públicas. O patamar deste ano ficou em 32,4%, um leve recuo
em relação ao ano passado, quando o índice ficou em 33,9%. “É importante
ressaltar que, em alguns cursos, simplesmente não há demanda”, declarou. Este é
um dos pontos criticados pela Frente Pró-cotas da Unicamp, formada por
estudantes. Segundo comunicado do grupo, ao considerar o percentual de 35% das
vagas já reservadas no Paais, a universidade estaria destinando 17,5% para este
segmento. “É a metade da proporção das populações negra e indígena do estado”.
Saiba Mais
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Debate
O grupo de trabalho sobre cotas criado pela
reitoria promoveu audiências públicas no ano passado e apresentou relatório em que indica a
necessidade de adoção de ações afirmativas na universidade. O texto mantém
aspectos do Paais, mas propõe a reserva de vagas para estudantes pretos e
pardos com percentual de 18,6% das vagas disputadas por estudantes de escolas
públicas e o mesmo percentual da ampla concorrência, totalizando 37,2% das
vagas para negros. Para indígenas, a proposta é reservar duas vagas em todos os
cursos e por turno, em um vestibular próprio.
O indicativo é que os departamentos discutam a
proposta para uma decisão na reunião do Conselho Universitário no final de
maio.
Pós-graduação
O Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH),
do qual o Departamento de Sociologia faz parte, foi pioneiro na universidade em
adotar o sistema de cotas na pós-graduação. Medeiros destaca que a experiência
tem sido avaliada de forma muito positiva. “Entraram novos projetos de pesquisa
na pós-graduação, com temas que não costumavam frequentar ou que há algum tempo
não apareciam”, apontou. Além disso, ampliou-se o número de alunos de outros
estados. “Houve uma renovação de uma agenda de pesquisa que é absolutamente
importante para o desenvolvimento científico”, acrescentou.
O professor disse ainda que a iniciativa impulsionou
outros departamentos a fazerem esse debate. “Há um movimento geral na sociedade
e um movimento crescente no interior da universidade para que haja debate e
eventualmente implementação da reserva de vagas para negros e indígenas,
visando o aumento da diversidade e a complexificação da visão de mundo
científico”, apontou. Como exemplo de que o debate tem avançado, ele lembrou da
aprovação da reserva de vagas para negros e indígenas na Faculdade de Direito da Universidade
de São Paulo (USP), uma das mais tradicionais do país, por meio do
Sistema de Seleção Unificada (Sisu).
Edição: Amanda
Cieglinski
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